Tratamento percutâneo de insuficiência mitral com implante de MitraClip em paciente nonagenário
Paciente masculino, 92 anos, com antecedente de hipertensão arterial sistêmica e insuficiência cardíaca secundária a miocardiopatia hipertensiva, admitido no serviço há 3 meses, e desde então mantido em ambiente hospitalar por quadro insuficiência cardíaca descompensada. Durante a internação teve diversas admissões na unidade de terapia intensiva por exacerbação do quadro e difícil manejo clínico. Atualmente evoluindo com dispnéia aos pequenos esforços. ECG com ritmo sinusal e sinais de sobrecarga de câmaras esquerdas. Ecocardiograma transtorácico (ETT) e transesofágico (ETE) com hipocinesia difusa de grau moderado do ventrículo esquerdo (VE), fração de ejeção reduzida (FEVE: 40%) e insuficiência mitral importante de etiologia mista secundária a degeneração da válvula e falha de coaptação dos folhetos (vídeo 1). Por considerar o elevado risco cirúrgico e o predomínio do mecanismo funcional como causa da disfunção valvar, indicada tentativa de reparo da regurgitação mitral com implante percutâneo de MitraClip (Abbott Vascular)(figura 1).
Implante percutâneo de MitraClip:
Após anestesia geral e intubação orotraqueal, realizada punção da veia femoral direita e posicionado introdutor 18F. Em seguida realizada punção do septo interatrial com agulha de punção transeptal guiada por ETE. Após ultrapassar o septo com a bainha, posicionado fio-guia 0,035’’ teflonado de alto suporte na veia pulmonar superior esquerda. Retirada a bainha e trocado o intrudutor femoral 18F pelo sistema de liberação 24F do MitralClip (figura 2) posicionando a extremidade distal do cateter deflectível no interior do átrio esquerdo direcionando-o para a valva mitral com o auxílio da fluoroscopia e do ETE tridimensional. Diversas imagens do ETE bi e tridimensional foram utilizadas definindo dois jatos principais de regurgitação à altura da transição entre os segmentos A1-P1/A2-P2 e A2-P2/A3-P3. Utilizando o ETE, posicionado o primeiro clip em posição medial, perpendicular à comissura mitral e sobre o jato regurgitante entre A1-P1/A2-P2. O clip foi, então, avançado para o interior do VE, com seus braços abertos. Obtido o posicionamento ideal, o clip foi fechado, capturando-se porções equivalentes das cúspides da valva mitral. Detectou-se redução imediata da intensidade da regurgitação mitral no segmento medial mas com aumento da intensidade do jato no segmento mais lateral da válvula. Realizado implante de mais dois clips em direção à posição lateral (entre A2-P2/A3-P3) com redução imediata da intensidade da regurgitação de 4+/4+ para 1+/4+ (vídeo 2). Ao final do procedimento, após o implante dos 3 clips (figuras 3 e 4), o gradiente médio de pressão transvalvar mitral se manteve baixo (2,5 mmHg) e dentro do aceitável. Por fim, removido sistema de entrega e realizada sutura endovascular com um único dispositivo Perclose ProGlide (Abbott Vascular) aplicado no sítio de punção na veia femoral.
O paciente evoluiu estável durante todo o procedimento e apresentou melhora importante de classe funcional após o procedimento. Controle ecocardiográfico após 7 dias do implante demonstrou redução acentuada de câmaras esquerdas, melhora da fração de ejeção do VE e manutenção do resultado sobre a regurgitação mitral.
Comentários:
O caso demonstrado ilustra um cenário relativamente comum na prática clínica diária. Paciente internado com difícil manejo de insuficiência cardíaca secundária a alteração anatômica e funcional da válvula mitral e risco cirúrgico muito elevado. Embora nonagenário, o paciente apresentava funcionalidade cognitiva preservada, o que motivou a opção por tentativa de reparar/reduzir a intensidade da regurgitação mitral com a aproximação “edge to edge” dos folhetos mitrais com implante do MitraClip. Procedimento realizado tecnicamente com sucesso. E clinicamente o paciente vem apresentando melhora clínica importante.
Figura 4
Figura 3
Figura 2
Figura 1
Video 1
Video 2
Comments